Desafios para a reorganização da classe trabalhadora foram discutidos no primeiro dia de seminário do ANDES-SN

Publicado em 28 de Junho de 2025 às 20h14. Atualizado em 28 de Junho de 2025 às 20h20

Teve início neste sábado (28), o II Seminário sobre Reorganização da Classe Trabalhadora do ANDES-SN. A atividade acontece no sábado e domingo (29), no auditório da Associação de Docentes da Universidade de Brasília (Adunb Seção Sindical do ANDES-SN), na capital federal.

Fotos: Eine Luz / Imprensa ANDES-SN

A mesa de abertura foi coordenada por Raquel Dias, 1ª vice-presidenta do ANDES-SN, e contou com as presenças de Maria Luiza Pinho Pereira, 1ª vice-presidenta da Adunb SSind., Caio Sad, diretor do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UnB, Gustavo Seferian, presidente do Sindicato Nacional.

Maria Luiza ressaltou que o seminário trata de um tema urgente, necessário, oportuno e, sobretudo, desafiador não apenas no sentido da reflexão, mas da práxis. Caio reforçou a necessidade de organização da classe trabalhadora e da juventude diante dos ataques sofridos em todo mundo. Acrescentou que é fundamental intensificar a denúncia do genocídio do povo Palestino e cobrar que o gverno federal e as universidades públicas rompam todas as relações com o Estado de Israel.

Gustavo iniciou lembrando que a data, 28 de junho, marca o Dia Internacional do Orgulho LGBTI+. Conforme Seferian, o Dia marca o levante insurrecional, liderado por mulheres trans latinas e negras pelo seu direito de existência, de poder viver em espaços de sociabilidade e de poder viver sem qualquer forma de temor.

O presidente do ANDES-SN lembrou também que, em 28 de junho de 1950, teve início o Massacre das Ligas Bodo, o que classificou como um dos mais esquecidos massacres da nossa história. Os Massacres das Ligas Bodo foram uma sequência de massacres e crimes de guerra, na Coreia do Sul, que assassinaram mais de 200 mil militantes comunistas e simpatizantes de esquerda, no início da guerra coreana.

De acordo com dirigente, é importante também lembrar as derrotas, pois fazem parte da nossa história. “Com aqueles e aquelas, anônimos e anônimas que tombaram, a gente segue na construção das nossas boas lutas e nos desafios postos no hoje”, acrescentou.

Seferian destacou que o Seminário sobre Reorganização da Classe Trabalhadora é um espaço de acúmulo, um espaço formativo, “um espaço para que possamos impulsionar também boas elaborações resolutivas, de larga e estratégica dimensão, no âmbito do nosso sindicato”, afirmou.

Os desafios da classe trabalhadora
Os debates tiveram início com a mesa “Os desafios da classe trabalhadora”, com explanação de Virgínia Fontes, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e Gilberto Calil, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), e coordenação de Josevaldo Cunha, 2º vice-presidente da Regional Nordeste 2 do ANDES-SN e Raquel Dias.

Virgínia iniciou sua fala lembrando os processos de luta e de dificuldade de mobilização durante a pandemia, que deixaram traços nas relações. “É possível lutar mesmo em condições muito adversas, é possível construir em condições muito adversas”, afirmou.

A docente tratou três pontos centrais em sua fala: o sentimento anticapitalista, os resultados da atuação hegemonista das classes atuantes e os desafios e configuração da classe trabalhadora.

“O capital é uma entidade abstrata, conduzida por sujeitos concretos. Portanto, é uma entidade abstrata quando a gente pensa em termos teóricos. Não existe capital, nem capitalismo, sem os sujeitos concretos que o portam. Então, portanto, o primeiro é o enfrentamento com o capital, aos capitalistas, denunciando”, disse. “Dando nomes aos bois”, acrescentou.

A docente ressaltou ainda que um ponto fundamental, tanto no cenário internacional quanto nacional, é que, pela primeira vez, se coloca com clareza que as relações capitalistas são responsáveis pelo colapso ambiental. “Há 20 anos atrás, a palavra capitalista não participava da grande mídia. Ela não existia na grande mídia. Era mundo livre, mundo democrático, alguma coisa desse tipo. Não capitalista. Hoje, ela figura e passeia, inclusive na grande mídia, no cenário internacional e no nacional. E é claro que é preciso enfrentar o sistema. Que tem uma luta anti-sistema. E, obviamente, é no terreno dessa luta anti-sistema que o fascismo vai entrar, falsificando o conjunto dessa luta”, explicou.

Virgínia lembrou ainda que, embora haja um esvaziamento de espaços de organização como sindicatos e partidos, há também outras formas de organização surgindo. “Nós temos muitos movimentos pequenos emergindo no país. Aqui têm movimentos de lutas de todos os tamanhos procurando se ligar, porém com profundas e legítimas desconfianças dos sindicatos e partidos”, observou, ressaltando a importância do debate para avançar nas reflexões sobre como aproximar os movimentos em luta contra o inimigo comum, o capital.

Gilberto Calil abordou o ascenso da extrema direita e do neofascismo internacionalmente e no Brasil. Ele ressaltou que as expropriações se tornaram mais violentas com a retirada de direitos sociais, mercantilização dos serviços e intensificação da exploração sobre os trabalhadores.

Segundo o docente, houve um esvaziamento do conteúdo efetivo da democracia e a transferência das decisões fundamentais para organismos transnacionais, imunes a qualquer controle democrático. Conforme Calil, em um contexto de crise aguda, a classe dominante oscila entre dois projetos de reafirmação da ordem - o fascismo e democracia blindada. O fascismo, porém, nunca é a primeira opção, pois é pouco palatável.

“O avanço ideológico do conservadorismo social e moral e do liberalismo econômico antipopular é fruto de uma ofensiva ideológica alicerçada em vasta rede de aparelhos privados de hegemonia, facilitada pelo desmonte ou cooptação de organizações vinculadas ao movimento dos trabalhadores, e ainda pelo desarmamento ideológico promovido pelo discurso assumido pelos governos de conciliação de classes identificados como de esquerda”, afirmou. “Este processo precisa ser compreendido em uma temporalidade alargada. Ele não tem início em 2015 ou em 2013, pois suas bases são sistematicamente construídas antes”, acrescentou.

O docente abordou ainda as diferentes formas de organização da extrema direita no Brasil, através da construção de aparelhos, trabalho organizativo minucioso, sistemático e de longo. Calil pontuou que a construção de bases para o avanço do conservadorismo se deve, em parte, às consequências políticas de uma esquerda sem espírito de cisão. Segundo ele, o problema central dos governos de conciliação de classes é a recusa ao enfrentamento ideológico, à verdadeira disputa pela hegemonia - concepção de mundo.

“A opção por não confrontar os interesses dos grupos dominantes implicava não apenas na presença de grupos conservadores no interior do governo, mas também possibilitava seu fortalecimento político. A opção pela conciliação de interesses determinou que as transformações fossem muito gradativas e limitadas, condicionadas à continuidade do crescimento econômico. Em um contexto de crise econômica mundial, tornou-se imprescindível fazer opções, e as opções feitas, sobretudo em 2015, privilegiaram o capital financeiro e fragilizaram o apoio popular e fortaleceram a direita”, afirmou.

Trabalho, consciência de classe e experiências sindicais
No período da tarde, a segunda mesa temática “Trabalho, consciência de classe e experiências sindicais” contou com as exposições da professora Eblin Farage (UFF) e de Nestor Bezerra, do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil da Região Metropolitana de Fortaleza, e mediação de Caroline Lima, 1ª secretária do ANDES-SN.

Eblin Farage iniciou pontuando duas ações da atual diretoria do ANDES-SN, que considera acertadas, para ilustrar sua explanação: as construções das greves da Educação Federal e de várias universidades estaduais em 2024 e a criação do Grupo de Trabalho de Organização Sindical das Oposições (GTO). “Essas duas ações dialogam muito com os debates que devem nos desafiar para o próximo período. Foram decisões políticas de construção do coletivo que implicam na mobilização da nossa categoria”, disse.

“E para a gente discutir o processo de reorganização da classe, que passa pela reorganização da nossa categoria enquanto parte da classe trabalhadora, é necessário que a gente se esforce e se empenhe, sobremaneira, em ações que coloquem a nossa categoria em movimento”, acrescentou. “E movimento que eu digo é movimento em todos os sentidos: de nos encontrarmos, de dialogarmos, de fazer mobilizações, de fazer pressão no governo, de fazer pressão nas nossas reitorias, mas também de abrir diálogo com setores que às vezes estão fora do nosso âmbito mais imediato”, explicou.

Para a docente da UFF, é fundamental pensar na reconfiguração do mundo do trabalho e os impactos que essas transformações têm na categoria docente e no serviço público. “Como nosso processo de trabalho como docente também é atingido pelo processo de reconfiguração do mundo do trabalho?”, questionou.

Farage destacou também a importância de refletir sobre como forjar consciência social nesse cenário de individualização, onde há poucos espaços de construção coletiva. “Nós estamos no processo de produção de uma consciência social que cada vez mais privilegia a individualidade, o individualismo”, observou.

A ex-presidenta do ANDES-SN pontuou ainda os desafios do Sindicato Nacional, que apesar de ter um modus operandi de funcionamento ímpar entre  os sindicatos, bastante democrático, tem dificuldades em dialogar para além da categoria e se relacionar com outras parcelas da classe trabalhadora. “Os pilares desse sindicato, que são a autonomia e a independência de classe, parecem ser os pilares acertados para uma entidade que se pretende uma entidade classista”, afirmou.

Nestor Bezerra falou da organização dos trabalhadores da construção civil e os desafios de manter a organização e regularidade na sindicalização em uma categoria de alta rotatividade. Segundo ele, só o trabalho de base diário garante que o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil da Região Metropolitana de Fortaleza tenha cerca de cinco mil sindicalizados.

O dirigente ressaltou que um dos grandes desafios é a disputa de consciências, uma vez que trabalhadores ouvem cotidianamente que sindicatos não servem para nada.  Outra questão é a divisão da classe trabalhadora. “Gente, a classe trabalhadora é a classe trabalhadora, independente de que ela seja pública ou que ela seja privada. A primeira tarefa é a gente aprender isso”, observou.

Bezerra lembrou da recente greve realizada pela categoria no Ceará, em maio, em luta por uma série de reivindicações relacionadas à garantia de direitos trabalhistas e à melhoria das condições de trabalho. Ele contou que os patrões cortaram o salário no início da paralisação, mas ainda assim o movimento seguiu forte e foi suspenso após um acordo mediado pelo Ministério Público do Trabalho, que instituiu também um grupo com representantes dos sindicatos patronal e laboral para discutir o acesso ao vale-combustível.

O operário da construção civil comentou também sobre as mortes de trabalhadores em seu setor, um dos mais afetados por acidentes de trabalho.

Conforme Nestor, em 2017, morreram sete trabalhadores em Fortaleza. O sindicato realizou um ato com sete caixões para denunciar as mortes e o descaso dos patrões e da sociedade. “Em 2025, já teve uma morte”, comentou, afirmando que apesar disso, a situação melhorou um pouco após a denúncia.

Diante dos assédios e riscos à saúde e segurança, o sindicalista disse que a organização acaba sendo a alternativa. “Trabalhador quando não tem para onde correr, corre para o sindicato”, afirmou.

Ele reforçou ainda a importância de debates como o promovido pelo ANDES-SN e da perspectiva de luta mais ampla da classe trabalhadora. “A gente precisa entender que os trabalhadores, independente da função pública ou privada, eles são trabalhadores que têm que saber que a exploração é em todos os locais, de formas diferenciadas, mas todo mundo é explorado”, destacou.

Para Sérgio Barroso, docente da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), os debates do primeiro dia do II Seminário sobre Reorganização da Classe Trabalhadora ajudarão a municiar a categoria para os enfrentamentos futuros. “Nós tivemos duas mesas muito importantes, com muitas reflexões sobre os desafios que nós temos que superar na busca dessa reorganização da classe trabalhadora. A gente sabe que o ANDES-SN, enquanto Sindicato Nacional, tem um papel importante nisso. Devemos buscar essa construção, principalmente nesse cenário em que nós estamos agora, de avanço da extrema direita, do fascismo, e de todos esses ataques aos nossos direitos”, avaliou.

“É muito importante que, nesse contexto todo, a gente busque, ainda mais, essa reorganização, para conseguirmos fazer um enfrentamento a todos esses ataques que não afetam só a categoria docente, afetam a classe trabalhadora como um todo”, acrescentou o 1º tesoureiro eleito do Sindicato Nacional para o biênio 2025/2027. A nova diretoria do ANDES-SN tomará posse no dia 11 de julho, na abertura do 68º Conad.

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