Mais de 500 trabalhadores são resgatados de situação análoga à escravidão no MT

Publicado em 11 de Agosto de 2025 às 15h00.

Uma força-tarefa composta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério do Trabalho e Emprego e Polícia Federal resgatou 563 trabalhadores em condições análogas à escravidão na obra da TAO Construtora, em Porto Alegre do Norte (MT), na última quarta-feira (6). Os trabalhadores atuavam na construção de uma usina de etanol da 3tentos. 

Foto: Vagner Teixeira Maciel / GSI/PGT

As investigações sobre a situação desses trabalhadores foram intensificadas após um incêndio destruir alojamentos, no último dia 20 de julho, e expor um cenário de extrema precariedade. De acordo com o MPT, as inspeções constataram condições degradantes nos alojamentos e locais de trabalho, além de inúmeras violações às normas de saúde e segurança do trabalho. 

Durante audiências administrativas realizadas entre 30 de julho e 5 de agosto de 2025, foram ouvidos trabalhadores e representantes da empresa, cujos depoimentos confirmaram uma série de violações aos direitos trabalhistas. Os trabalhadores resgatados eram majoritariamente de outros estados, especialmente do Maranhão, Piauí e Pará.

Conforme relatos colhidos pelas equipes do MPT, as condições dos alojamentos eram extremamente precárias, as jornadas exaustivas chegavam até a 22 horas de trabalho e as refeições oferecidas continham larvas e moscas. Os trabalhadores dormiam em quartos superaquecidos, em colchões usados e de má qualidade. Não eram fornecidos travesseiros, fronhas ou roupas de cama adequadas. Havia também superlotação, com trabalhadores dormindo no chão sob mesas, quando não havia camas disponíveis.

De acordo com as informações colhidas pelos auditores-fiscais do Trabalho, a situação se agravou nas semanas que antecederam o incêndio, quando problemas no fornecimento de energia elétrica se tornaram frequentes. A falta de energia causava a interrupção do bombeamento de água dos poços artesianos para as caixas d'água, deixando os trabalhadores sem água para consumo e higiene pessoal. 

Os depoimentos revelaram que nos dias anteriores ao incêndio, os trabalhadores precisaram tomar banho com canecas e enfrentaram filas enormes para usar banheiros sujos devido à falta de água. No dia do incêndio, a situação atingiu um ponto crítico e a empresa foi obrigada a utilizar caminhões pipa para buscar água do Rio Tapirapé, fornecendo água turva e inadequada para consumo nos bebedouros. 
A precariedade das condições de trabalho e alojamento, somada à falta de água e energia por dias consecutivos, criou um ambiente insustentável que culminou na destruição dos alojamentos masculino e feminino, parte da panificadora e da guarita de entrada.

As inspeções também revelaram graves violações às normas de segurança do trabalho no canteiro de obras. Os trabalhadores eram expostos a condições insalubres, com refeitórios inadequados, locais de trabalho sem refrigeração e excesso de poeira. Foram constatados acidentes do trabalho não registrados adequadamente, incluindo trabalhadores que sofreram lesões nas mãos e pés, além de doenças de pele causadas pelos produtos manuseados. A falta de equipamentos de proteção individual e as condições precárias de trabalho colocavam em risco a saúde e segurança de todos os empregados.

Ainda foram confirmadas irregularidades na jornada de trabalho. Os trabalhadores eram submetidos ao sistema denominado "cartão 2", onde laboravam além da jornada contratual de 8 horas e 48 minutos diárias, chegando a trabalhar até 22 horas e aos domingos. As horas extras eram controladas em planilhas separadas e pagas em cheques ou dinheiro, "por fora" da folha de pagamento oficial, caracterizando sonegação fiscal e precarização das relações trabalhistas.

Foto: Vagner Teixeira Maciel / GSI/PGT

Os depoimentos indicaram que muitos trabalhadores foram aliciados por intermediários em suas cidades de origem, pagando do próprio bolso as passagens para chegar ao local de trabalho, sendo posteriormente descontados os valores em seus salários. Aqueles que não passavam no exame médico ou não eram aprovados no processo seletivo ficavam sem recursos para retornar às suas cidades. A alimentação fornecida era inadequada e repetitiva, com trabalhadores relatando a existência de larvas e moscas na comida, além de alimentos requentados e deteriorados. O refeitório era quente e sem ventilação adequada.

Após o incêndio, a empresa foi obrigada a alojar os trabalhadores em hotéis e casas alugadas na cidade. Foram registradas 18 demissões por justa causa, 173 pedidos de rescisão antecipada de contratos por prazo determinado e 42 pedidos de demissão. Cerca de 60 trabalhadores perderam todos os seus pertences pessoais no incêndio.

As investigações da força-tarefa prosseguem, com análise de documentos e não está descartada a necessidade de novas inspeções no local.  A empresa TAO Construtora possui atualmente quatro obras em Mato Grosso, empregando aproximadamente 1.200 trabalhadores, sendo a obra de Porto Alegre do Norte a maior delas.

Segundo informação do Ministério do Trabalho e Emprego, apesar das graves infrações identificadas, a empresa manifestou disposição para firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), com o objetivo de reparar os danos causados e prevenir novas violações. Comprometeu-se também a custear as despesas de transporte e alimentação para o retorno dos trabalhadores aos seus estados de origem, além de restituir os valores indevidamente cobrados pela viagem inicial. Será paga, ainda, uma compensação de R$ 1.000,00 a cada trabalhador pelos bens pessoais perdidos no incêndio.

Os auditores-fiscais do Trabalho permanecem no local acompanhando os desdobramentos da operação e zelando pela garantia dos direitos dos trabalhadores. Está assegurado que os resgatados terão acesso ao seguro-desemprego na modalidade especial destinada a vítimas de trabalho análogo à escravidão, além do pagamento integral das verbas rescisórias, incluindo salários pagos "por fora", horas extras, férias proporcionais, 13º salário, FGTS e demais indenizações devidas.

Fonte: MPT, com edição e inclusão de informações do ANDES-SN

Compartilhe...

Outras Notícias
ÚLTIMAS NOTÍCIAS
EVENTOS
Update cookies preferences